25 de Junho de 2022
- 2º Grau
Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro
Detalhes da Jurisprudência
Órgão Julgador
Publicação
Julgamento
Relator
Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro
Inteiro Teor
Poder Judiciário da União
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS
TERRITÓRIOS
Órgão 8ª Turma Cível
Processo N. APELAÇÃO CÍVEL 0724083-63.2020.8.07.0003
APELANTE (S) JULIANA CORREIA CORTES
APELADO (S) TELEFÔNICA BRASIL S.A.
Relator Desembargador EUSTAQUIO DE CASTRO
Acórdão Nº 1372714
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. TELEFONIA. INSCRIÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. ALEGAÇÃO DA AUTORA DE QUE NÃO CONTRATOU OS SERVIÇOS. PRELIMINAR DE ERROR IN PROCEDENDO SUSCITADA DE OFÍCIO. AUSÊNCIA DE
DECISÃO DE SANEAMENTO E ORGANIZAÇÃO DO FEITO. NULIDADE. RECURSO
CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA CASSADA.
1. Nos termos do artigo 357 do Código de Processo Civil, na decisão de saneamento e organização do processo, deverá o Juiz resolver as questões processuais pendentes, delimitar as questões de fato sobre as quais recairá atividade probatória, especificando os meios de prova admitidos, definir a distribuição do ônus da prova, delimitar as questões de direito relevantes para a decisão do mérito e designar, se
necessário, audiência de instrução e julgamento.
2.Configura cerceamento de defesa e ofensa ao devido processo legal a ausência de efetivo
saneamento do processo, sem a delimitação das questões de fato sobre as quais deveria recair a
atividade probatória e a especificação dos meios de prova admitidos.
3. Apelação conhecida e provida. Sentença cassada.
ACÓRDÃO
Brasília (DF), 23 de Setembro de 2021
Desembargador EUSTAQUIO DE CASTRO
Relator
RELATÓRIO
Trata-se de Apelação Cível interposta por JULIANA CORREIA CORTES contra a Sentença
proferida pelo Juízo da Segunda Vara Cível da Circunscrição Judiciária de Ceilândia que, em Ação
Declaratória de Inexistência de Relação Jurídica e Repetição de Indébito c/c Reparação de Danos
Morais ajuizada em desfavor de TELEFÔNICA BRASIL S.A. , julgou improcedentes os pedidos.
Em suas razões recursais (ID 27459683), a apelante defende não ter contratado os serviços da apelada e não ter morado no endereço constante no sistema informado na Contestação. Acrescenta residir em seu atual endereço há mais de 10 (dez) anos e nunca ter adquirido aparelho ou chip da apelada.
Afirma não ter sido demonstrada a contratação, pela apelante, de nenhum serviço da apelada.
Ao final, pede a reforma da Sentença para que seja julgado procedente os pedidos de declaração de
inexigibilidade das cobranças indevidas e a condenação da apelada em pagar danos materiais e morais.
Preparo dispensado em razão da concessão, pelo Juízo a quo, dos benefícios da Assistência Judiciária Gratuita.
Em Contrarrazões (ID 27459689), a apelada pugna pela revogação do benefício da Justiça Gratuita
deferido à apelante. No mérito, pede seja negado provimento ao recurso.
É o relatório.
VOTOS
O Senhor Desembargador EUSTAQUIO DE CASTRO - Relator
Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso e recebo-o no duplo efeito, nos termos do artigo 1.012 do Código de Processo Civil.
1. Sumário do Recurso
da apelada em cadastro de proteção ao crédito.
2. Da Preliminar de Error in Procedendo
Suscito, de ofício, a preliminar de error in procedendo, tendo em vista que a contratação dos serviços
da ré/apelada pela parte autora/apelante é ponto controvertido e não ocorreu o saneamento do feito e a delimitação das questões de fato sobre as quais deveria recair a atividade probatória.
O artigo 357 do Código de Processo Civil estabelece as hipóteses em que deverá ser proferida decisão de saneamento e de organização do processo.
Nesta fase, além de resolver as questões processuais pendentes, deve o julgador delimitar as questões de fato sobre as quais recairá a atividade probatória; definir a distribuição do ônus da prova; delimitar as
questões de direito relevantes para a decisão do mérito e designar, se necessário, audiência de instrução e julgamento.
Nessa linha, o saneamento do processo confere eficiência à atuação jurisdicional, tornando mais
qualificado o debate estabelecido entre as partes e o Juiz, privilegiando-se, com atenção também aos
Princípios da Cooperação e da Não Surpresa (artigos 6º e 9º do Código de Processo Civil), do
Contraditório e da Ampla Defesa, a fim de que se alcance uma solução justa e eficaz do litígio.
Ademais a parte somente pode especificar as provas que pretende produzir após a delimitação das
questões controvertidas pelo Juiz, em cooperação com as partes, na fase de saneamento e organização do processo, viabilizando-se, então, que, de acordo com os fatos controvertidos sobre os quais deve incidir a produção probatória, as partes indiquem as provas que pretendem produzir, proferindo-se, após, decisão sobre sua admissão ou não (artigo 357, inciso II, do Código de Processo Civil).
Observe-se que, nos termos do artigo 357, parágrafo 3º, do Código de Processo Civil, se a causa
apresentar complexidade em matéria de fato ou de direito, deverá ser designada audiência para que se
promova, em cooperação com as partes, o chamado saneamento compartilhado do processo.
De suma importância registrar, ainda, que o artigo 370 do Código de Processo Civil consubstancia os
poderes instrutórios do Juiz, nos seguintes moldes:
“Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao
julgamento do mérito.
Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente
protelatórias.”
Assim, conforme preceitua o normativo mencionado, "abre-se ao juiz a possibilidade de, mesmo diante
da inércia das partes no tocante à produção probatória, a determinação de tal produção de ofício. Tal
postura, permitida pela lei, deve, até mesmo pela própria lógica do sistema, somente ser adotada após as partes terem esgotado as provas que pretendiam produzir. Após a realização das provas pelas partes, e ainda havendo questão não clara ao juiz, nenhum problema haverá se o juiz determinar a sua produção de ofício.” (Neves, Daniel Amorim Assumpção. Op. Cit., pág. 650 – grifos nossos).
Destarte, esgotada a produção de provas, se o Magistrado verificar a necessidade de esclarecimentos de
questões, pode até mesmo determinar, de ofício, a realização da prova necessária à formação completa de seu convencimento.
causa. Visa-se, em verdade, a prestação de uma tutela jurisdicional adequada, a resposta jurisdicional à
demanda de forma efetiva e qualificada, não podendo o juiz ser mero espectador durante o trâmite da
ação judicial, podendo-se valer dos poderes instrutórios concedidos pela legislação, de modo que
possam ser aclarados os fatos controvertidos e, desse modo, de forma qualificada e equânime, ser dito o
Direito” (In
https://evertonraphael.jusbrasil.com.br/artigos/357489954/poder-instrutorio-do-juizabusca-da-verdade-real-no-novo-cpc . Acesso em 27/08/2021), observando-se os demais princípios processuais, tais como o da Paridade de
Armas, da Demanda, da Cooperação e Não Surpresa, bem como o disposto no artigo 373 do Código de
Processo Civil.
Nesse sentido, lecionam Marinoni, Arenhart e Mitidiero , em sua obra “O Novo Processo Civil”
(Revista dos Tribunais, São Paulo, 2015, páginas 260/270) que, “o juiz tem o poder – de acordo com o
sistema do Código de Processo Civil brasileiro –, quando os fatos não lhe parecerem esclarecidos, de
determinar a prova de ofício, independentemente de requerimento da parte ou de quem quer que seja que
participe do processo, ou ainda quando estes outros sujeitos já não têm mais a oportunidade processual
para formular esse requerimento.” (pag. 269). Asseveram, outrossim, que, “se o processo existe para a
tutela dos direitos, deve-se conceder ao magistrado amplos poderes probatórios para que possa cumprir
sua tarefa” (Apud https://evertonraphael.jusbrasil.com.br/artigos/357489954/poder-instrutorio- do-juizbusca-da-verdade-real-no-novo- cpc. Acesso em 27/11/2020).
No caso em testilha, o Juízo a quo não delimitou as questões de fato sobre as quais deveria recair a
atividade probatória e não especificou os meios de prova admitidos (artigo 357, inciso II, do Código
de Processo Civil), o que comprometeu significativamente o desfecho da lide, especialmente se
verificada a necessidade de apresentação de outros documentos, configurando hipótese manifesta de error
in procedendo e ofensa ao devido processo legal, apta a ensejar a cassação da Sentença.
Nessa mesma linha de raciocínio, pertinente a transcrição de precedente desta Corte de Justiça, in verbis:
“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE CONHECIMENTO. ABONO DE PERMANÊNCIA. JULGAMENTO
ANTECIPADO DA LIDE. AUSÊNCIA DE SANEAMENTO. SENTENÇA. IMPROCEDÊNCIA. FATOS
CONSTITUTIVOS DA PRETENSÃO AUTORAL. CERCEAMENTO DE DEFESA CARACTERIZADO.
NULIDADE DE SENTENÇA. TEORIA DA CAUSA MADURA. INAPLICABILIDADE.A ausência de
análise do pedido de produção de prova, bem como a não realização do saneamento do feito,
especialmente se verificada a necessidade de apresentar outros documentos além daqueles que
acompanharam a inicial, configura cerceamento de defesa. Caracteriza error in procedendo o
julgamento antecipado da lide sem a apreciação de pedido de produção de prova feito pelo autor, para
completar a instrução probatória. É inaplicável a teoria da causa madura, quando há necessidade de
dilação probatória.” (Acórdão 1300532, 07002982720208070018, Relator: ESDRAS NEVES, 6ª
Turma Cível, data de julgamento: 18/11/2020, publicado no DJE: 2/12/2020.)
3. Dispositivo
Diante do exposto, CONHEÇO DO RECURSO e DOU-LHE PROVIMENTO para CASSAR a
Sentença.
Deixo de fixar honorários recursais, pois a ocorrência de error in procedendo não enseja a fixação da
verba sucumbencial (Acórdão n.1006385, 20120710380298APC, Relator: ESDRAS NEVES 6ª
TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 22/03/2017, Publicado no DJE: 04/04/2017. Pág.: 393/408).
É como voto.
Com o relator
DECISÃO
APELAÇÃO CONHECIDA E PROVIDA. SENTENÇA CASSADA. UNÂNIME.