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- 2º Grau
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Inteiro Teor
Poder Judiciário da União Fls. _____
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS
Órgão | : | 8ª TURMA CÍVEL |
Classe | : | APELAÇÃO CÍVEL |
N. Processo | : | 20160910093667APC (0009190-32.2016.8.07.0009) |
Apelante(s) | : | WILLIAN ANDRADE DOS SANTOS |
Apelado(s) | : | BANCO VOLKSWAGEN S.A. E OUTROS |
Relator | : | Desembargador MARIO-ZAM BELMIRO |
Acórdão N. | : | 1068693 |
E M E N T A
PROCESSO CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. ANULAÇÃO DE CONTRATO. DOLO. SIMULAÇÃO. VÍCIOS NÃO DEMONSTRADOS.
1. Ao autor incumbe o ônus de provar o fato constitutivo do seu direito, conforme estabelece o art. 373, I, do Código de Processo Civil.
2. Não há dolo ou simulação se os elementos dos autos deixam de demonstrar disparidade entre a vontade expressa e a vontade oculta do comprador no momento do negócio jurídico.
3. Recurso desprovido.
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Apelação Cível 20160910093667APC
A C Ó R D Ã O
Acordam os Senhores Desembargadores da 8ª TURMA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, MARIO-ZAM BELMIRO -Relator, ANA CANTARINO - 1º Vogal, DIAULAS COSTA RIBEIRO - 2º Vogal, sob a presidência da Senhora Desembargadora ANA CANTARINO, em proferir a seguinte decisão: RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. UNÂNIME. , de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.
Brasilia (DF), 7 de Dezembro de 2017.
Documento Assinado Eletronicamente
MARIO-ZAM BELMIRO
Relator
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Apelação Cível 20160910093667APC
R E L A T Ó R I O
Cuida-se de apelação (fls. 222/234) interposta de sentença (fls. 201/208) que, nos autos da ação de conhecimento, sob o procedimento comum, ajuizada por WILLIAN ANDRADE DOS SANTOS em desfavor de TAGUAUTO TAGUATINGA AUOMÓVEIS E SERVIÇOS LTDA e BANCO VOLKSWAGEN S/A, julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial.
Inconformado, o recorrente aduz que não se discute a hipossuficiência do consumidor pelo analfabetismo, mas a alteração dos termos do contrato sem a devida informação clara e aquiescência do comprador, caracterizando o vício de consentimento denominado dolo.
Ressalta a necessidade de análise da prova testemunhal produzida em juízo, na qual a vendedora esclarece sobre a alteração dos termos contratuais e que as informações não teriam sido repassadas ao adquirente.
Por fim, defende que é devida a reparação por danos morais.
Contrarrazões apresentadas pelos réus às fls. 241/256 e 258/266, pugnando pelo desprovimento do recurso do autor.
É o relatório.
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V O T O S
O Senhor Desembargador MARIO-ZAM BELMIRO - Relator
Admito e recebo o recurso no efeito devolutivo e dele conheço, presentes os requisitos legais.
Cuida-se de apelo interposto pelo autor contra a r. sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial.
Inconformado, o recorrente aduz que não se discute a hipossuficiência do consumidor pelo analfabetismo, mas a alteração dos termos do contrato sem a devida informação clara e aquiescência do comprador, caracterizando o vício de consentimento denominado dolo.
Ressalta a necessidade de análise da prova testemunhal produzida em juízo, na qual a vendedora esclarece sobre a alteração dos termos contratuais e que as informações não teriam sido repassadas ao adquirente.
Por fim, defende que é devida a reparação por danos morais.
Examinando o argumento de alteração dos termos do contrato sem ciência do consumidor, tem-se a proposta de compra de veículo, emitida em 18/11/2015, no valor de R$ 45.990,00 (quarenta e cinco mil, novecentos e noventa reais).
Desse valor, R$ 28.990,00 (vinte e oito mil, novecentos e noventa reais) seriam financiados, R$ 8.890,00 (oito mil, oitocentos e noventa reais) por TED em 19/11/2015 e R$ 8.110,00 (oito mil, cento e dez reais) descrito como "RECIBO DE DESCONTO", consoante documento de fl. 31.
Comprova o autor ter realizado transferência bancária no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais) em 19.11.2015, a título de sinal.
A primeira ré apresentou cédula de crédito bancário, datada de 04/12/2015, com pagamento estabelecido em 60 (sessenta) parcelas de R$ 846,82 (oitocentos e quarenta e seis reais e oitenta e dois centavos) - fls. 117/118.
Observa-se que foram pagas as parcelas de janeiro a março de 2016 e a ação foi ajuizada em 03/05/2016 (fls. 172/175).
Conclui-se que, no conjunto documental dos autos, não ficou demonstrada qualquer alteração do contrato sem a devida informação clara e aquiescência do consumidor.
Ao contrário, pela prova testemunhal produzida em juízo, que, por sinal, o apelante pretende ver reexaminada, verifica-se que o ajuste foi regular e, portanto, de acordo com o preceitos de direito do consumidor. Constata-se tal
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higidez do acordo no depoimento da vendedora do veículo (fl. 203):
(...) Sabe dizer que combinou uma parcela com o autor, no valor de R$ 790,00, mas o cadastro do autor não foi aprovado junto ao banco, de maneira que, fazendo outro contrato de financiamento com outro banco, a parcela ficou em R$ 840,00. Então, a empresa chamou o autor para a assinatura do contrato, quando esclareceu ao mesmo a alteração dos valores . Não sabe dizer porque o autor, pouco tempo depois, resolveu dizer que não sabia da alteração do valor, mesmo porque o contrato do Banco Volkswagen, é numa folha separada, onde constam todos os valores. (...) (grifo nosso)
Assim, peço vênia para adotar, como razões de decidir, fundamentos da r. sentença, prolatada pelo MM. Juiz de Direito, Rodrigo Otávio Donati Barbosa, ad litteram:
Colhe-se dos autos que o autor assinou proposta de compra e venda de veículo aos 18.11.2015, pelo valor total de R$ 45.990,00 (quarenta e cinco mil, novecentos e noventa reais), com financiamento de R$ 28.990,00 (vinte e oito mil, novecentos e noventa reais), a ser pago em 60 (sessenta) parcelas de R$ 846,80 (oitocentos e quarenta e seis reais e oitenta centavos) - fls. 108/109.
Aos 04.12.2015, o autor firmou cédula de crédito bancário para pagamento da quantia financiada (fls. 117/120), nos termos da proposta de compra e venda anteriormente assinada.
Alega o autor, contudo, que o valor final do contrato e da prestação diverge daquele inicialmente informado pela vendedora da primeira ré, que teria se aproveitado da condição de analfabeto do autor, ludibriando-o para assinar contrato em valor diverso da proposta apresentada. Aponta, assim, a existência de dolo e de simulação.
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Como se sabe, o dolo, vício do negócio jurídico causado por conduta ardilosa de terceiro com o intuito de enganar (uma espécie de erro provocado por terceiro), encontra previsão no art. 145 e seguintes, sendo possível o dolo por omissão (art. 147 do CC).
A simulação, a seu turno, é vício social do negócio jurídico que causa a sua nulidade, verificada quando há discrepância entre a vontade e a declaração, em que as partes contratantes estão combinadas com o objetivo, em regra, de prejudicar terceiros. Nos termos do § 1º do art. 167 do CC, haverá simulação nos negócios jurídicos quando: I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem; II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira; III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pósdatados.
Exposta a diferenciação conceitual entre os vícios apontados na inicial, resta claro que não houve a realização de negócio simulado.
(...)
No ponto, reitero que a demonstração de vício de consentimento é ônus que incumbe à parte que o alega, ainda que se trate de relação de consumo, por se tratar de fato constitutivo de seu direito.
E o conjunto probatório coligido aos autos não permite concluir pela existência do apontado vício. Deveras, a alegação do autor de que é analfabeto não interfere, por si só, na validade da avença, pois tal condição não o torna incapaz. É dizer: a condição de analfabeto não é suficiente para embasar o argumento de que o autor não foi devidamente informado sobre os termos do ajuste firmado, o que exige efetiva comprovação. Lado outro, não há prova inequívoca de que vendedora da primeira ré tenha atuado com o intuito de ludibriar o autor, apesar de ter ocorrido alteração da proposta inicialmente ofertada, como se extrai da prova testemunhal colhida.
(...)
Ainda que seja questionável a formalização de contratos de
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compra e venda por analfabetos sem acompanhamento, não há como inferir que o autor não tivesse a menor compreensão do que assinava ou de que não tenha sido orientado a respeito da alteração das parcelas. A alegação de vício de consentimento, portanto, é desprovida de comprovação. Assinalo que sem embargo de estar caracterizada relação de consumo - caracterizada pela presunção de vulnerabilidade do consumidor e pela mitigação da autonomia da vontade em determinadas situações - essa última não pode ser desprezada sem prova contundente de que o contratante (consumidor) não tinha pleno conhecimento do alcance de cláusula expressa no ajuste.
Vale mencionar que o princípio da boa-fé objetiva exige a conduta leal dos contratantes, impondo comportamentos éticos, sendo um dos desdobramentos da boa-fé a proibição de comportamento contraditório - violador da confiança despertada na outra parte.
Desse modo, se o autor não tinha condições de entender o contrato em que apôs livremente sua assinatura, deveria ter informado a circunstância à vendedora, protegendo-se a esfera jurídica de ambas as partes. Além disso, o pedido de nulidade de toda a avença revela que o autor se arrependeu da pactuação, já que sequer postula a redução das parcelas para o valor inicialmente proposto.
Assim, ausente comprovação de vício de consentimento, o pleito autoral não merece amparo. Por conseguinte, ausente demonstração de ato ilícito praticado pelas rés, a pretensão indenizatória também não comporta acolhimento.
Por fim, o requerimento da primeira ré quanto ao reconhecimento da litigância de má-fé não deve ser acolhido, porquanto ausentes os seus pressupostos legais.
Como se vê, os argumentos do autor não dão ensejo ao reconhecimento de simulação ou dolo capaz de nulificar a avença havida entre as
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partes, haja vista a ausência de disparidade entre a vontade expressa e a vontade oculta do comprador no momento do negócio jurídico.
Por tais fundamentos, nego provimento ao recurso, para prestigiar às inteiras a r. sentença hostilizada.
Em homenagem à previsão do artigo 85, § 11, do CPC/2015, que estabelece o dever de o magistrado majorar os honorários da sede monocrática, em face do trabalho adicional realizado pelo patrono em grau recursal, acresço 2% (dois por cento) à verba já arbitrada na r. sentença ao causídico da parte ré.
Porém, a exigibilidade está suspensa para o autor, nos termos do art. 98, § 3º, do mesmo diploma.
É o meu voto.
A Senhora Desembargadora ANA CANTARINO - Vogal
Com o relator
O Senhor Desembargador DIAULAS COSTA RIBEIRO - Vogal
Com o relator
D E C I S Ã O
RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. UNÂNIME.