25 de Junho de 2022
- 2º Grau
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Detalhes da Jurisprudência
Órgão Julgador
Publicação
Julgamento
Relator
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Inteiro Teor
Poder Judiciário da União Fls. _____
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS
Órgão | : | 5ª TURMA CÍVEL |
Classe | : | APELAÇÃO CÍVEL |
N. Processo | : | 20160110781785APC (0022128-83.2016.8.07.0001) |
Apelante(s) | : | FORD MOTOR COMPANY BRASIL LTDA |
Apelado(s) | : | CYNTHIA BOABAID ITAPARY PINHEIRO E OUTROS |
Relator | : | Desembargador SEBASTIÃO COELHO |
Acórdão N. | : | 1087014 |
E M E N T A
CONSUMIDOR. PROCESSUAL CIVIL. VENDA DE VEÍCULO NOVO COM DEFEITOS. PROVA PERICIAL. LIVRE CONVENCIMENTO DO MAGISTRADO. RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS PELO VEÍCULO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. RAZOABILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. 1. De acordo com o sistema do livre convencimento motivado o magistrado pode analisar os fatos alegados considerando todas as provas produzidas, de modo que as conclusões do laudo pericial não vinculam obrigatoriamente o julgador.
2. Se o vício no produto não é sanado pelos fornecedores, no prazo de trinta dias, pode o consumidor exigir a restituição da quantia paga, sem que seja descontado qualquer percentual por desvalorização, art. 18, § 1º, do CDC.
3. Configura dano moral a ocorrência de vícios reiterados em veículo novo, devendo o valor da indenização ser fixado em atenção aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. 4. Recurso conhecido e desprovido.
Fls. _____
Apelação Cível 20160110781785APC
A C Ó R D Ã O
Acordam os Senhores Desembargadores da 5ª TURMA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, SEBASTIÃO COELHO -Relator, SILVA LEMOS - 1º Vogal, JOSAPHA FRANCISCO DOS SANTOS - 2º Vogal, sob a presidência do Senhor Desembargador SEBASTIÃO COELHO, em proferir a seguinte decisão: CONHECER. NEGAR PROVIMENTO. UNÂNIME. , de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.
Brasilia (DF), 21 de Março de 2018.
Documento Assinado Eletronicamente
SEBASTIÃO COELHO
Relator
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Apelação Cível 20160110781785APC
R E L A T Ó R I O
Cuida-se de Apelação Cível interposta por FORD MOTOR COMPANY BRASIL LTDA (ré), contra a sentença de fls. 315/325, proferida pela 11ª Vara Cível de Brasília, na Ação Declaratória c/c Danos Morais e Materiais, que julgou procedentes os pedidos autorais, condenando a apelante/ré a restituir a quantia paga pelo veículo e a pagar R$ 7.000,00 a título de danos morais.
Em suas razões (fls. 329/353) a apelante/ré afirma que quando da realização da prova pericial o carro não apresentou qualquer anomalia e que a sentença foi proferida em desconformidade com as provas produzidas nos autos. Além disso, alega que o veículo sempre foi utilizado normalmente e que os reparos foram efetuados corretamente.
Argumenta que o valor da rescisão contratual deve ter por base os valores da Tabela FIPE, pois o veículo foi adquirido em 2014 e que não houve dano moral, uma vez que não restou demonstrada a inutilização do veículo e por ser normal a necessidade de reparos.
Requer a reforma da sentença para que sejam julgados improcedentes os pedidos autorais. Caso assim não se entenda, requer que a restituição considere os valores atuais da tabela FIPE e que seja afastada ou reduzida a condenação por danos morais.
Preparo regular (fl. 331).
Sem contrarrazões (fl. 361).
É o relatório.
Fls. _____
Apelação Cível 20160110781785APC
V O T O S
O Senhor Desembargador SEBASTIÃO COELHO - Relator
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do apelo e passo a sua análise.
O recurso deve ser desprovido.
Verifica-se dos autos que a apelada/autora adquiriu o veículo FORD NEW FIESTA 1.6, ano/modelo 2014/2014, zero quilômetro, em 26/02/2014, pela quantia de R$ 58.000,00. Com menos de três meses de uso a apelada/autora se dirigiu até a concessionária para informar o primeiro defeito do veículo, após correção do problema, passou-se um ano e a apelada/autora constatou defeito na transmissão automática do veiculo, tendo que levar para reparo por 10 vezes, no período de um ano (fls. 19/32).
A apelante/ré argumenta que a perícia judicial não constatou qualquer defeito no veículo e que os vícios já foram sanados pela concessionária, o que justifica a reforma da sentença para que sejam julgados improcedentes os pedidos autorais.
O consumidor quando adquire um veículo zero quilômetro tem a legítima expectativa de ter um produto de alta qualidade, sem nenhum dono prévio, sem qualquer avaria ou defeito. Presume-se que passou por toda a avaliação da fábrica e possui um padrão de qualidade inquestionável, estando em plenas condições de funcionamento.
Embora a conclusão do laudo pericial tenha apontado que não foi constatada qualquer inconformidade atual no veículo, a perícia observou quatro variações no deslizamento das embreagens que sugerem o início de um processo de desgaste prematuro da embreagem, além de não descartar a possibilidade de reincidência do defeito (fl. 259).
Além do laudo pericial é fato incontroverso e comprovado pelas várias ordens de serviços juntadas aos autos que o veículo apresentou o mesmo defeito reiteradas vezes, tendo a concessionária reconhecido o vício e realizado a reprogramação do módulo de controle e a troca do conjunto de embreagem. Acrescentem-se a isso as notícias juntadas pela apelada/autora, em que se verifica a reiteração de problemas de embreagem em veículos da Ford, que também demonstram a existência dos vícios apontados na inicial (fls. 33/39).
Veja-se entendimento do STJ:
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Apelação Cível 20160110781785APC
DIREITO CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. VEÍCULO NOVO. VÍCIO DO PRODUTO. INCOMPATIBILIDADE ENTRE O DIESEL COMERCIALIZADO NO BRASIL E AS ESPECIFICAÇÕES TÉCNICAS DO PROJETO.PANES REITERADAS. DANOS AO MOTOR. PRAZO DE TRINTA DIAS PARA CONSERTO. RESTITUIÇÃO DO VALOR PAGO. DANO MORAL. CABIMENTO.
(...)
2.- Não é possível afirmar que o vício do produto tenha sido sanado no prazo de 30 dias, estabelecido pelo artigo 18, § 1º, caput, do Código de Defesa do Consumidor, se o automóvel, após retornar da oficina, reincidiu no mesmo problema, por diversas vezes. A necessidade de novos e sucessivos reparos é indicativo suficiente de que o veículo, embora substituídas as peças danificadas pela utilização do combustível impróprio, não foi posto em condições para o uso que dele razoavelmente se esperava.
3.- A jurisprudência do STJ orienta-se no sentido de ser cabível indenização por dano moral quando o consumidor de veículo zero quilômetro necessita retornar à concessionária por diversas vezes, para reparos.
4.- Recurso Especial provido.
( REsp 1443268/DF, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/06/2014, DJe 08/09/2014)
Uma vez que o ordenamento brasileiro adota o sistema do livre convencimento motivado, o magistrado pode analisar os fatos alegados considerando todas as provas produzidas, de modo que as conclusões do laudo pericial não vinculam obrigatoriamente o julgador. Dessa forma, ainda que no momento da perícia técnica não tenha sido verificado o vício alegado, há prova nos autos que demonstram sua existência à época do ajuizamento da ação.
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Apelação Cível 20160110781785APC
Na hipótese em que o produto contém vício que o torna impróprio ou inadequado ao fim a que se destina, bem como lhe diminua o valor, cumpre ao fornecedor buscar solução definitiva no prazo de 30 dias, caso contrário, tornam-se disponíveis ao consumidor, alternativamente, as possibilidades previstas no § 1º do artigo 18 do Código de Defesa do Consumidor: (I) a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso; (II) a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; (III) o abatimento proporcional do preço.
A apelante/ré argumenta que, caso seja mantida a condenação pela restituição do valor pago do veículo, deve ser observada a tabela FIPE, ante a desvalorização do bem. No entanto, o art. 18, § 1º, do CDC é claro ao apontar que cabe ao consumidor optar pela restituição imediata da quantia paga pelo bem defeituoso. Assim, deve ser mantida a condenação da apelante/ré para restituir o valor pago pela apelada/autora.
Assim já decidiu este Tribunal:
CIVIL, CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
PRELIMINARES. ILEGITIMIDADE PASSIVA. FALTA DE INTERESSE. REJEIÇÃO. APELAÇÕES. RESCISÃO DE CONTRATOS. COMPRA E VENDA DE VEÍCULO E FINANCIAMENTO BANCÁRIO. VÍCIO NO PRODUTO. PROBLEMA NO AR CONDICIONADO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA E OBJETIVA DOS FORNECEDORES. RESTITUIÇÃO DA QUANTIA PAGA. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. AGRAVO RETIDO IMPROVIDO. APELAÇÕES DOS RÉUS IMPROVIDAS. APELO DO AUTOR PROVIDO.
(...)
4. Se o vício no produto não é sanado pelos fornecedores, no prazo de trinta dias, pode o consumidor exigir, dentre outras opções, "a restituição imediata da quantia paga (...)" (art. 18, § 1º, CDC), sem qualquer abatimento relativo à desvalorização do veículo, uma vez que os prejuízos financeiros decorrentes do deságio não podem ser atribuídos ao comprador. 4.1. É
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Apelação Cível 20160110781785APC
irrelevante, para fins de acolhimento do pedido de rescisão contratual, que o defeito no ar condicionado não impeça o uso regular do veículo. 4.2. Da mesma forma, também não importa saber o número de vezes em que o adquirente foi obrigado a se dirigir à concessionária, para consertar o carro. Basta que tenha havido o transcurso dos 30 dias, sem que a concessionária tenha conseguido corrigir o defeito, para que nasça o direito de pleitear a rescisão contratual.
(...)
(Acórdão n.1040101, 20140111136872APC, Relator: JOÃO EGMONT 2ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 16/08/2017, Publicado no DJE: 21/08/2017. Pág.: 497/520)
Quanto ao dano moral, reconhece-se o abalo moral do consumidor que, ao adquirir veículo novo, se vê impossibilitado de usufruir tranquila e continuamente do bem sem que este apresente falhas. No caso, a apelada/autora teve que ir 11 vezes à concessionária para realizar reparos no veículo.
Vislumbra-se que os vícios recorrentes apresentados no veículo causaram não só um mero dissabor à apelada/autora, mas violaram sua personalidade e frustraram suas expectativas de usufruir de um veículo zero quilometro.
Estando comprovado o fato danoso, a conduta ilícita da fornecedora e da fabricante do veículo e o nexo causal entre a conduta e o dano, impõe-se o dever de indenizar.
Sobre a existência de dano moral nessas situações já decidiu o STJ:
AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO.VEÍCULO NOVO. DEFEITO. DANOS MORAIS. VALOR. SÚMULA N. 7/STJ. (...)
2. É cabível indenização por dano moral quando o consumidor de veículo zero quilômetro necessita retornar à concessionária por diversas vezes para reparo de defeitos apresentados no
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Apelação Cível 20160110781785APC
veículo adquirido. Precedentes.
3. O valor da verba indenizatória por dano moral, no caso dos autos, foi fixado dentro dos padrões da razoabilidade e proporcionalidade, com base nos fatos e provas dos autos e a revisão do julgado nesse sentido fica obstada pela incidência do enunciado 7 da Súmula do STJ.
4. Agravo regimental a que se nega provimento.
( AgRg no AREsp 776.547/MT, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 04/02/2016, DJe 12/02/2016)
Quanto ao valor da indenização, este deve ser fixado de acordo com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, respeitando a repercussão do evento danoso, a capacidade patrimonial das partes, o grau de culpa do ofensor e se atentando para evitar o enriquecimento sem causa.
Em atenção aos pressupostos acima, às funções reparadoras, punitivas e preventivas da indenização por dano moral, mostra-se devido o valor de R$ 7.000,00 fixado na sentença, por ser proporcional e razoável ao caso.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso.
Fixo os honorários advocatícios recursais em 5% do valor da condenação, com base no art. 85, § 11, do CPC.
É como voto.
O Senhor Desembargador SILVA LEMOS - Vogal
Com o relator
O Senhor Desembargador JOSAPHA FRANCISCO DOS SANTOS - Vogal
Com o relator
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Apelação Cível 20160110781785APC
D E C I S Ã O
CONHECER. NEGAR PROVIMENTO. UNÂNIME.
Código de Verificação :2018ACOBSRGYJMDJ5BK20LQWN15