17 de Agosto de 2022
- 2º Grau
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Detalhes da Jurisprudência
Processo
Órgão Julgador
Publicação
Julgamento
Relator
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Inteiro Teor
Poder Judiciário da União
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS
TERRITÓRIOS
Órgão 4ª Turma Cível
Processo N. APELAÇÃO CÍVEL XXXXX-94.2018.8.07.0007
APELANTE (S) MARIA MARGARIDA DE ALVARENGA
APELADO (S) BV FINANCEIRA S/A CFI
Relator Desembargador LUÍS GUSTAVO B. DE OLIVEIRA
Acórdão Nº 1195686
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSUAL CIVIL. PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. FUNDAMENTOS DO RECURSO DISSOCIADOS DAS RAZÕES DE DECIDIR. RECURSO NÃO CONHECIDO.
1. Pelo princípio da dialeticidade, cabe à recorrente impugnar as razões lançadas na sentença,
buscando demonstrar a existência de erro in procedendo ou in judicando, a merecer a declaração de
nulidade da decisão ou novo julgamento da causa.
2. Optando a parte por deduzir fato ou considerações totalmente divorciados dos fundamentos da
decisão vergastada, resta malferido o princípio da dialeticidade e, consequentemente, falece o recurso da respectiva adequação ou regularidade formal.
3. RECURSO NÃO CONHECIDO.
ACÓRDÃO
Acordam os Senhores Desembargadores do (a) 4ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito
Federal e dos Territórios, LUÍS GUSTAVO B. DE OLIVEIRA - Relator, FERNANDO HABIBE - 1º Vogal e ARNOLDO CAMANHO - 2º Vogal, sob a Presidência do Senhor Desembargador
ARNOLDO CAMANHO, em proferir a seguinte decisão: NÃO CONHECER DO RECURSO,
UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.
Brasília (DF), 21 de Agosto de 2019
Relator
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta por MARIA MARGARIDA DE ALVARENGA, em face à sentença
que julgou improcedentes os pedidos iniciais, na ação de revisão de contrato cumulada com
compensação por danos morais, ajuizada em desfavor de BV FINANCEIRA S/A CRÉDITO,
FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO.
As partes firmaram contrato de financiamento de automóvel em novembro de 2011.
A autora aduziu que o valor atribuído ao bem foi superior em 30% ao indicado na tabela FIPE e, ainda, foram exigidas taxas ilegais, tais como a tarifa de cadastro, IOF, avaliação do bem e registro de
contrato, no total de R$2.600,00.
Em 24/04/2017, diante da inadimplência contratual, foi constrangida a entregar o veículo para a ré, em razão de cobrança realizada em sua residência, o que teria causado abalo moral.
Após a tradição, a instituição financeira vendeu o bem e obteve montante superior à dívida, mas o
excesso não lhe foi repassado.
Ao final, requereu a condenação da requerida à devolução em dobro das tarifas cobradas
indevidamente (R$2.600,00), restituir o saldo superavitário advindo da venda do veículo (R$3.039,00) e compensar os danos morais em R$10.000,00.
Com a inicial vieram documentos.
BV FINANCEIRA ofereceu contestação (ID XXXXX).
Em preliminar, postulou a extinção do feito nos termos do artigo 485, IV do Código de Processo Civil ou a suspensão do curso processual, em face da decisão proferida no Recurso Especial nº 1578526/SP, sob o rito dos recursos repetitivos.
No mérito, sustentou que a cobrança dos juros e das tarifas contratuais observou a legislação pátria e as condições pactuadas entre as partes.
Não houve cobrança vexatória e, portanto, seria indevida a compensação por danos morais.
Réplica no ID XXXXX.
Sobreveio sentença que julgou improcedentes os pedidos, sob o fundamento de que as partes
transacionaram sobre o contrato objeto da ação (ID XXXXX).
Inconformada, a demandante interpôs apelação (ID XXXXX).
Aduziu que pagou indevidamente a tarifa de cadastro, IOF, avaliação do bem e registro de contrato. A cobrança não seria autorizada pelas normas do Banco Central, por isso o montante deveria ser
restituído em dobro.
Houve cobrança vexatória do débito em sua residência, por isso o abalo moral sofrido deveria ser
compensado.
Ao final, requereu que fosse conhecido e provido o recurso “para que seja condenada a requerida a
restituir a autora os valores e taxas cobradas indevidamente” (ID XXXXX – pág. 6).
Sem preparo, em virtude do deferimento dos benefícios da justiça gratuita.
Nas contrarrazões, BV FINANCEIRA suscitou preliminares de não conhecimento do recurso ou
suspensão do curso processual, em face à decisão proferida sob o rito dos recursos repetitivos (ID
6752959).
A apelante foi intimada para manifestar-se sobre as preliminares e, ainda, sobre a ausência de
impugnação dos fundamentos da decisão recorrida (ID XXXXX).
Manifestação no ID XXXXX.
É o relatório.
VOTOS
O Senhor Desembargador LUÍS GUSTAVO B. DE OLIVEIRA - Relator
Primeiramente, analiso os pressupostos de admissibilidade do recurso.
O artigo 1.010, incisos III e IV, do Código de Processo Civil estabelece que, no recurso, constarão as razões e o pedido da recorrente.
Vale esclarecer que a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.
Serão, porém, objeto da apreciação e julgamento pelo tribunal, todas as questões suscitadas e
discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, desde que relativas ao capítulo
impugnado.
Com efeito, a regra impõe o ônus de a parte expor, fundamentadamente, o desacerto da decisão a ser merecedora de novo julgamento.
Trata-se do que a moderna doutrina denomina como princípio da dialeticidade. Por conta disso, cabe à suplicante impugnar as razões lançadas no decisum, buscando demonstrar a existência de erro in
procedendo ou in judicando, para alcançar a declaração de nulidade da decisão ou novo julgamento da causa (Súmula 182/STJ).
Sobre a questão, valiosas as lições de Fredie Didier Jr[1]:
De acordo com esse princípio, exige-se que todo recurso seja formulado por meio de petição pela
qual a parte não apenas manifeste sua inconformidade com ato judicial impugnado, mas, também e
necessariamente, indique os motivos de fato e de direito pelos quais requer o novo julgamento da
questão nele cogitada.
Rigorosamente, não é um princípio: trata-se de exigência que decorre do princípio do contraditório, pois a exposição das razões de recorrer é indispensável para que a parte recorrida possa
defender-se, bem como para que o órgão jurisdicional possa cumprir seu dever de fundamentar as
decisões.
No caso em análise, a sentença julgou improcedentes os pedidos iniciais, sob o seguinte fundamento
(ID XXXXX – pág. 3):
Percebo que, conquanto a autora narre a abusividade das cobranças e o constrangimento sofrido no ato de apreensão do veículo, o documento denominado “Termo de entrega amigável com quitação de contrato” é expresso ao dispor que “As partes declaram que o presente termo dá quitação geral ao
contrato, não havendo mais nada o que reclamar (...)” - (Id XXXXX).
Logo, é notório que a autora, no exercício de sua autonomia privada, transigiu quanto aos direitos
ora discutidos dos autos (Id XXXXX). Ausente qualquer prova que o acordo possua vícios objetivos ou subjetivos, presume-se que seja válido e possui força vinculante entre as partes.
Aliás, verifico que a ré discorreu precisamente em sua defesa quanto à existência do acordo, sendo
que, em réplica, a autora não impugnou o fato, atendo-se em reafirmar a argumentação já tecida na inicial (Id22578551).
Em verdade, concluo que a atuação da autora implica no abandono da boa-fé contratual, eis que
poderia ter se recusado a aceitar a proposta de transação, ingressando, em seguida, com a respectiva ação judicial, mas assim não o fez.
Desse modo, nos termos em que foi proposta esta demanda, com prévio acordo entre as partes, a
procedência do pedido implicaria na promoção do comportamento contraditório, o qual encontra
barreiras na boa-fé objetiva.”
Já nas razões de recurso, a apelante limitou-se a sustentar a ilegalidade e abusividade das cobranças,
bem como o constrangimento sofrido por ocasião da restituição do veículo.
Nas razões de apelo, não houve menção sobre a transação ocorrida entre as partes, quanto aos direitos discutidos na demanda, fundamento do juízo de primeiro grau para rejeitar a pretensão inicial.
Dessa forma, a recorrente apresentou fundamentos completamente dissociados da matéria abordada na sentença.
É sabido que é vedado às partes inovarem quanto aos fatos ou fundamentos no curso da demanda. O
mesmo ocorre na fase recursal, cujo juízo é de revisão e não de criação. E nesse particular, prevalece o princípio tantum devolutum quantum apellatum.
A falta de logicidade ou correlação entre os fundamentos do recurso e as razões de decidir do acórdão violariam o princípio da dialeticidade.
Neste sentido é o entendimento deste Tribunal de Justiça:
DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. CHEQUE PRESCRITO. AÇÃO MONITÓRIA.
AJUIZAMENTO. POSSIBILIDADE. PRAZO PRESCRICIONAL. DÍVIDA LÍQUIDA. INCIDÊNCIA
DO ARTIGO 206, § 5º, DO CÓDIGO CIVIL. PRESCRIÇÃO. OFENSA AO PRINCÍPIO DA
DIALETICIDADE. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO.
2.De acordo com o art. 1.010 do CPC/15, regra que hospeda o princípio da dialeticidade recursal, a impugnação dos fundamentos que dão o suporte à decisão apelada constitui pressuposto recursal
objetivo, sem o qual resta impedido o conhecimento do recurso.
3.O fato de a apelante não ter apresentado argumentos voltados a afastar as razões de decidir
expostas na r. sentença evidencia flagrante ofensa ao princípio da dialeticidade recursal, o que
impede o conhecimento do recurso, ante sua manifesta inadmissibilidade.
4. Apelação não conhecida.
(Acórdão n.1038600, 20140110803825APC, Relator: CESAR LOYOLA 2ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 09/08/2017, Publicado no DJE: 17/08/2017. Pág.: 275/284)
PROCESSO CIVIL. ESCRITURA DE COMPRA E VENDA COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE
IMÓVEL. RESCISÃO. CULPA EXCLUSIVA DA VENDEDORA. VIOLAÇÃO AO DEVER DE
INFORMAÇÃO. IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA. AUSÊNCIA. PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE.
OFENSA. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. CITAÇÃO.
1. Dispõe o art. 1.010 do Código de Processo Civil que a apelação conterá a exposição do fato e do direito, bem como as razões do pedido de reforma. Nesse sentido, cumpre ao recorrente trazer as
razões do seu inconformismo, confrontando especificamente os argumentos da decisão impugnada.
2. O motivo da rescisão contratual não foi impugnado de forma específica pela apelante em suas
razões recursais, tornando-se desnecessária, por conseguinte, a análise dos pontos que dele
decorrem, sob pena de afronta ao princípio da dialeticidade.
3. Nos casos de rescisão de contrato de compra e venda de imóvel por culpa exclusiva da ré, os juros moratórios incidem a partir da citação.
4. Recurso parcialmente conhecido e desprovido. (Acórdão n.1031350, 20160110604063APC,
Relator: SANDOVAL OLIVEIRA 2ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 12/07/2017, Publicado no DJE: 17/07/2017. Pág.: 322/334)
APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO. DANOS MATERIAIS E MORAIS. OFENSA AO PRINCÍPIO
DA DIALETICIDADE. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO.
O princípio recursal da dialeticidade e o inciso II do art. 514 do CPC/73 impõem à parte recorrente o dever de combater de forma clara e inequívoca, em suas razões, os fundamentos que servem de
alicerce ao capítulo da sentença que se impugna, expondo os motivos de fato e de direito do
inconformismo, sob pena de não conhecimento de seu recurso.
Recurso não conhecido.
Ante o exposto, NÃO CONHEÇO O RECURSO.
Em razão da sucumbência nesta instância recursal, nos termos do artigo 85, parágrafo 11, do Código de Processo Civil, majoro os honorários advocatícios em mais 2% (dois por cento), totalizando, em
definitivo, 12% (doze por cento) sobre o parâmetro estabelecido na sentença, cuja cobrança
permanecerá suspensa nos termos da lei, haja vista a recorrente litigar sob o pálio da justiça gratuita.
É como voto.
[1] DIDIER JR. Fredie e CARNEIRO DA CUNHA, Leonardo. Curso de direito processual civil : Meios de impugnação às decisões judiciais e processos nos Tribunais. 13º ed. Reformada - Salvador: Ed. JusPodivm, 2016. v. 3. p. 124.
O Senhor Desembargador FERNANDO HABIBE - 1º Vogal
Com o relator
O Senhor Desembargador ARNOLDO CAMANHO - 2º Vogal
Com o relator
DECISÃO
NÃO CONHECER DO RECURSO, UNÂNIME